Como vencer a frustração

A frustração é um sentimento desagradável. Mas infelizmente é muito comum, o que torna tudo ainda mais frustrante.

Saber o que estamos a sentir não é tarefa fácil porque temos um vocabulário mais extenso para palavrões do que para sentimentos. A frustração não é bem irritação, mas também não é tristeza. Não é desapontamento mas também não é raiva…

Em primeiro lugar devemos saber dar nome certo ao que estamos a sentir. É diferente estar triste, de estar magoado, de estar zangado, de estar frustrado. É diferente estar contente, de estar alegre, satisfeito ou radiante.

Ganharíamos muito em usar um vocabulário mais saudável sobre os nossos sentimentos: “Sinto-me triste quando isto acontece” em vez de “Estou só cansado”, “Tenho-me sentido ansioso e preocupado com este projeto” em vez de “O trabalho é sempre a mesma porcaria” ou “Sinto-me feliz quando fazes isto”, em vez de “Foi giro”.

Mas de onde vem a frustração?

Normalmente sentimo-nos frustrados quando as coisas não correm como esperaríamos. Se esperava encontrar-me com uma pessoa às 9 e ela atrasada é normal sentir-me frustrado. Se esperava chegar a casa em 10 minutos e demorei 30 minutos, sinto-me frustrado. Se esperava ver o lava-loiças vazio e encontro-o cheio de loiça suja, sinto-me frustrado…

Os 2 caminhos mais populares para lidar com a frustração são:

  • Disparar culpas em todas as direcções, sem tomar conta de como nos estamos a sentir: fizeste isto mal, é sempre a mesma coisa, nunca ninguém me ouve …
  • Atacar com a auto-culpa e auto-comiseração: não consegues fazer nada de jeito, que raiva teres-te esquecido disto, comigo nada corre bem…

Enfim, as táticas habituais de facto não trazem grande resultado, porque andamos a descarregar choques uns nos outros, ocupados e preocupados com a culpa, em vez de pararmos para reconhecer o que estamos a sentir e que necessidade gostaríamos de ver satisfeita em 1ºlugar.

Para evitar uma frustração temos apenas 2 caminhos: Mudar a realidade ou mudar a expectativa que temos sobre a realidade. Mudar a realidade é um trabalho exterior, mudar a expectativa é um trabalho interior.

Imaginemos que deixa-me frustrado ver a bancada da cozinha suja com comida.

Tenho então duas possibilidades: ou mudo a realidade (faço com que não haja sujidade na bancada) ou mudo a minha expectativa de não haver comida espalhada ali.

Curiosamente, ambas as soluções têm as suas vantagens e desvantagens.

  • Mudar a realidade pode ser o mais eficaz, mas normalmente mudar o mundo não é fácil. As coisas têm sido assim, porque há pessoas confortáveis em fazer as coisas assim, mudar seres humanos é complicado e demorado. Implica interagir abundantemente, coisa que apesar de fazermos muito, poucas vezes fazemos com sucesso.

Uma solução provisória para a frustração da bancada suja podia ser eu limpá-la. Mas isso não me tira nem a frustração, nem faz com que o outro deixe de a sujar. O trabalho difícil a ser feito é conversar com outra pessoa – explicar as ótimas razões que temos para a bancada estar limpa – ouvir o que o outro pensa sobre bancadas e as ótimas razões que tem para a sujar regularmente – e tentar negociar uma solução que deixe toda a gente satisfeita, ou pelo menos ninguém fique maluco. Não é de espantar quando nos propomos mudar alguma coisa, que acabemos numa discussão aos berros.

  • Mudar a expectativa não é em si um trabalho mais fácil. Em 1º lugar porque não estamos treinados para mudar de perspetiva. Gostamos de ver as coisas como vemos, porque raio haviamos de ver de outra forma? Não só isso como dá trabalho! A somar a isso temos que fazer com uma outra pessoa com quem nem sempre nos damos bem: nós mesmos. Mudar o que esperamos da vida implica também paciência, negociação e cedência. Tudo atributos que preferimos que os outros tenham.

O escritor E.B.White dizia “Acordo todas as manhãs determinado para mudar o mundo e ao mesmo tempo divertir-me imenso. Por vezes, isto torna planear o meu dia algo difícil…”

Quando temos expectativas desadequadas da realidade, estamos a criar uma frustração. Se quero ter imenso tempo livre, imenso gozo a trabalhar, imenso dinheiro e ainda fazer imensas atividades e estar com amigos, e já agora, tudo ao mesmo tempo, está garantido que vai dar para o torto.

Precisamos de destruir expectativas irrealistas na nossa vida. O raio da bancada não precisa de estar sempre impecável. Nem toda a gente consegue chegar sempre a horas. O trânsito numa cidade não é coisa fácil de resolver…

Será que consigo identificar quando sinto frustração? E como lido habitualmente com a frustração?

Criamos expectativas irrealistas em relação “ao mundo”, mas muitas vezes também em relação aos outros. Se espero que alguém me oiça, compreenda, divirta, elogie e goste de mim – e já agora faça-o em todos os momentos- vai ser difícil não ficar frustrado. Não esperemos das pessoas o que não nos conseguem dar. Por muito bem intencionada ou esforçada que outra pessoa seja, não é possível superar sempre as nossas expectativas. O outro tem o seu próprio mundo, necessidades e preocupações e por vezes não estão alinhadas com as nossas. Isto não significa ser cínico, nem trabalhar para equilibrios saudáveis.

Mas a parte chave é que criamos expectativas. Não caem do céu, não estão escritas na lei. Temos dezenas de razões e justificações que nos levam a querer as coisas de determinada forma – as coisas arrumadas assim, o trabalho feito daquela maneira, a comida pronta daquela forma – mas as expectativas são nossas. Não são do mundo, são minhas. Ganhemos o hábito de perguntar-nos: desta frustração o que pode ser da minha responsabilidade? Que expetativa irrealista posso ter criado?

Também não significa que devamos deixar de tentar mudar o mundo ou algum comportamento dos outros. É preciso resolver problemas concretos no mundo, é preciso mudar a realidade, sobretudo as coisas injustas e que causam sofrimento. O disparate começa quando querermos tudo AGORA, ou quando queremos fugir à nossa frustração que parte de uma expetativa desadequada.

Façamos o exercício:

Consigo identificar algum ambiente, alguma pessoa, alguma situação em que me sinta frustrado? E dessas situações quais são recorrentes? Quais acontecem pelo menos uma vez por semana?

Comecemos por trabalhar aí.

Há alguma forma que possa ver isto de outro ponto de vista?

Há alguma pessoa que encare isto de outra forma?

Por vezes, mudar a nossa forma de pensar pode ser muito difícil, mas se outras pessoas o conseguiram fazer, talvez eu consiga: Haverá alguém que não fica frustrado no trânsito? O que faz essa pessoa? Que estratégia funciona e pode funcionar para mim? Há pistas em todo o lado, só temos que procurar.

Ao longo da vida, e tantas vezes, vida longa, temos a oportunidade de ir mudando a realidade, a nossa casa, o nosso trabalho, as nossas amizades. Mas é um processo gradual e que implica paciência, amor e trabalho.

Tal como melhorar uma casa é um processo gradual – arrumar, mudar móveis, pintar paredes, fazer bricolage e limpezas- também mudar algo no nosso interior é um processo gradual: aceitar o que sentimos, perceber onde queremos arrumar as coisas, que divisões têm mais luz, onde me sinto bem, que limpezas devo fazer e o que quero deitar fora…

Demasiadas vezes ficamos na juventude de querer mudar o mundo para não sentirmos frustração. Concentremo-nos antes em mudar o nosso interior, e depois sim, transformemos a realidade.

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