Se haver pessoas que conspiram contra outras faz confusão, então se conspirarem contra nós ainda mais perturbador é. Por vezes temos aquela sensação que alguém não gosta mesmo de nós… e que deve estar a fazer alguma coisa contra nós. Não é necessário um enredo maquiavélico, às vezes basta um comentário desagradável, uma crítica ou um olhar, para acharmos que a principal ocupação daquela pessoa é arruinar a nossa vida.
É maravilhosamente tentador achar que o mundo está a conspirar contra nós, porque assim temos a possibilidade de representar 3 papéis que adoramos:
1. A Vítima
A vítima tem sempre alguém que a oprime. É sempre alvo de alguém, cujo divertimento é fazer-lhe injustiças. Fica sempre desamparada porque sente que não consegue responder a nada, e é um joguete nas mãos dos grandes conspiradores. Pensa frequentemente assim: coitadinha de mim, eles fazem o que querem e eu não consigo fazer nada.
2. O Protagonista
O protagonista vive no centro do mundo. Tudo gira à volta dele. Todas as outras pessoas do mundo, todos os interesses e todas as acções só têm uma coisa em comum: girar à volta do seu magnânimo ser. O protagonista pensa assim: tudo o que os outros dizem e fazem é por causa de mim.
3. O bonzinho
O bonzinho não é bom. É bonzinho. É moderado na sua caridade e prudente na sua generosidade. Não tem nada de menos desejável dentro de si, e tudo o que o incomoda, assusta e perturba, é de alguém de fora: os mauzinhos. O bonzinho projecta todos os seus fantasmas nos outros, nunca fez nada de disparatado e a culpa é sempre dos outros. Ele pensa assim: eu sou boa pessoa, portanto todos os erros e toda as maldades são feitas pelos outros.
Mas estas 3 personagens que vamos representando – a vítima, o protagonista e o bonzinho – falam mais acerca das nossas inseguranças, do que da conspiração dos outros. Elas revelam sobretudo uma terrível falta de memória:
1. Esquecemos que se somos vítimas é porque queremos ser vítimas. Mesmo havendo um opressor, temos sempre a liberdade para decidir o que fazer com o que nos acontece. O nosso fascínio pela autocomiseração é tremendo.
2. Esquecemos que não somos assim tão interessantes. As pessoas têm coisas mais importantes que fazer do que conspirar contra nós. Têm filhos para levar à escola, facturas para pagar e sogras com quem lidar. A nossa vida não é o centro do mundo para as outras pessoas.
3. Esquecemos que é mais fácil culpar os outros, do que assumir uma responsabilidade. Especialmente de tudo o que nos incomoda. Mais vale achar que o problema é dos outros do que nos darmos ao trabalho de assumir responsabilidade pelo que nos perturba e incomoda.
Isto quer dizer que não há ninguém com intenções menos agradáveis?
Não, não, pode haver… mas daí a conspirarem vai um salto grande. E no limite, mesmo que estejam… so what?
Somos o que somos, fazemos o que fazemos, com tudo de bom e tudo de disparatado. Temos que estar paranóicos com o que nos vão fazer?
Da próxima vez que nos estivermos a sentir vítima de uma conspiração, mais vale seguir o mote do escritor J.D Salinger: Sou um paranóico ao contrário: suspeito que as pessoas estão a conspirar para me fazer feliz.
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