Foste ouvindo aqui e ali uma mentira.
De tanto a repetirem, começaste a duvidar. E depois, suavemente, como em todas as mentiras, começaste a acreditar. E assim, rapidamente e sem o imaginares, começaste também a contá-la. Aqui e ali.
Cada novo filme, cartaz ou anúncio, fez-te uma promessa encantadora: A vida boa é livre de preocupações, de dificuldades, de sofrimentos.
Quando depois te bateu à porta uma pequena contrariedade, uma inesperada humilhação ou uma irritante frustração, reagiste logo com o orgulho ferido, culpando os outros ou o mundo, o que estivesse mais a jeito…
Desprezaste a evidência mais elementar – que a tua vida já te trazia diariamente contrariedades – e continuaste teimosamente à procura de um mundo alternativo, sem aquela contrariedade que te irrita, sem aquela dificuldade que só tu tens, sem aquele sofrimento que te atormenta.
Mas contaram-te uma mentira, não te esqueças.
Tanto quiseste acreditar na mentira e nas suas seduções – a vida de corpos perfeitos, de trabalhos de sonho e conforto sem fim – que começaste também tu a contar a mentira: partilhando exageradamente o lado cor de rosa da vida: o teu sucesso, a tua melhor refeição, a tua aventura.

Mas por muito que a tentes editar, a tua vida não quer ser controlada, não pode ser domesticada.
E por isso vives num desespero cada vez maior: não devias sofrer, mas estás a sofrer.
Sofres a dobrar: com o sofrimento que te toca, mas também porque achas que não é suposto, que não devia ser assim, que algo está errado…
Como não consegues sequer impedir o mais pequeno incómodo, vives como que em suspenso, tolerando teimosamente cada contrariedade, ansiando apenas pelo momento em que te vais finalmente livrar desse desconforto. E quando finalmente passa uma contrariedade, rapidamente percebes que já estás a viver outra coisa que te incomoda.
Contaram-te uma mentira, não te esqueças.
E tens que a enfrentar, porque a maior vítima és tu mesmo.
Tens que trocar essa mentira perturbadora pela verdade libertadora: a vida boa é esta mesmo: a tua, com todo o seu sofrimento e com toda a sua alegria. Esta mesmo, não tens outra.
Lembra-te das pessoas que mais admiras, as pessoas que vivem uma vida preenchida como tanto desejas… Repara como têm também grandes sofrimentos mas que os vivem com esperança, com coragem e com amor. Repara como ninguém se livrou da dor.
E se não vês nenhum sofrimento, é porque não estás a olhar com atenção, não estás a ver com o coração.
O sofrimento faz parte da vida, não podes escapar. Não o deves procurar ou desejar, mas tens que o aceitar. Tens que alargar a tua alma, respirar de novo e aceitar com naturalidade o que te calhar.
Quando assim viveres, vais conseguir saborear o que te é dado. Vais sentir uma libertação enorme: viver cada dificuldade como uma oportunidade. Finalmente vais poder viver em paz, porque tudo o que acontece pode ser vivido com sentido e amor.
Quando voltares a ouvir a mentira, não acredites. Mesmo que te estejam a gritar, não acredites.
Agora já sabes a verdade que não precisa de ser gritada, já sabes a verdade que te liberta:
O sofrimento faz parte da vida. Mas a vida com amor, é maior que qualquer dor.
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PS- Dedicado a Diogo AS, que soube viver com coragem e com amor.
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