As armadilhas dos consensos

Todos os dias recebemos uma dose generosa de coisas para fazer. Coisas como organizar a loiça numa prateleira, preparar um documento no trabalho ou escolher onde se vai passar férias. Muitas vezes são coisas que dependem apenas de nós, outras vezes são coisas que têm que ser decididas em conjunto.
Acontece que é muito comum querer gerar um consenso no que fazemos.
No caso de ser uma decisão a tomar sozinhos, queremos garantir que o que quer que escolhamos – os sapatos que vamos comprar, a viagem que vamos fazer, ou a mudança de carreira que queremos fazer – tem a aprovação de toda a gente. No caso de ser uma decisão conjunta, queremos garantir que toda a gente está alinhada e acha que certo caminho é o melhor.

Acontece que gerar um consenso, isto é, ter a concordância da maioria das pessoas, apesar de aparentar ser a decisão mais madura, mais democrática e mais equilibrada, pode esconder várias armadilhas. Vamos ver quais são e como evitá-las:

Armadilha 1: Querer que toda a gente pense como nós.
Muitas vezes temos a pretensão de achar que o mundo seria extraordinariamente melhor se toda a gente pensasse como nós. Por isso procuramos gerar consensos, mas que no fundo sejam à nossa maneira. Há certos tipos de consenso que mais se parecem com ditaduras, porque se está a forçar outras pessoas a pensar como nós.
Sobre o pretexto de gerar consensos começa-se assim a praticar uma violência permanente e silenciosa: manipular as coisas e as pessoas para que concordem com a nossa opinião. Mas acontece que o que não nos agrada tem direito a existir. Uma opinião diferente da nossa tem também direito a vingar.
O objectivo não pode ser persuadir – com mais ou menos força – toda a gente a pensar, ou a fazer como nós, mas antes ver como em conjunto podemos chegar a um entendimento mais profundo e a uma decisão mais justa. Num verdadeiro consenso é necessário estar disposto a abdicar de coisas que gostaríamos, para juntos, ganharmos mais.
É como se fosse andar de trotinete a 3, temos que estar alinhados para não nos espatifarmos.
armadilha do consenso
Armadilha 2: Agradar a toda a gente.
Há muitas pessoas que escolhem o caminho do consenso pela simples razão de querer agradar a toda a gente. Acontece que não só isso é tolo como é impossível.
Por exemplo, se no trabalho a definir um projecto quisermos agradar a toda a gente, estamos seguramente a garantir que o que vai sair dali é um Frankenstein que acabará por não agradar a ninguém. Em certos contextos é necessário assumir uma liderança e defender uma posição, mesmo que outras pessoas não concordem. Um pai não pode querer sempre agradar ao filho. Ora tomemos um pai que pergunta ao filho:
– Querido, o que gostavas de ter como presente nos anos?
– Pai, gostava de ter uma motoserra para brincar com os meus amigos.
– Isso não vai acontecer, ( e depois explica calmamente) porque gasta muita gasolina, ainda aleija alguém e limpar o sangue da alcatifa é uma chatice.

Armadilha 3: Pedir opiniões sem as ouvir.
Ao criar consensos gostamos de pedir opinião a outras pessoas. Mas isto de nada serve se não houver uma capacidade real de influenciar a decisão final. Consideremos um casal que está a pensar onde irá passar férias:
– Querida, onde gostavas de ir passar férias este ano?
– Gostava mesmo de ir apanhar sol para as Maldivas.
– Ah que boa ideia, mas já comprei bilhetes e vamos fazer um safari para o Quénia. Excelente não é?

Mais vale nem sequer pedir opinião se ela não for levada a sério. As pessoas sentem-se enganadas e manipuladas.
Mas isto não quer dizer que nunca se deva pedir opiniões. Há vezes em que a decisão já está tomada mas é saudável pedir opiniões, mas explicando isso com clareza: O orçamento para este projecto já está fechado, mas o que achas que poderíamos fazer diferente da próxima vez?

Haverá certamente mais armadilhas a evitar e mais coisas a dizer, mas a certo ponto é preferível fazer o que temos a fazer… e deixar de lado os consensos que tínhamos imaginado.


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Comments

Respostas de 2 a “As armadilhas dos consensos”

  1. Anónimo

    verdade mais que verdadeira.

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