Nunca vou ser o que tu queres.

Gastamos muitos perdigotos e neurónios a tentar persuadir os outros a serem o que nós queríamos que eles fossem.
 

Apesar das nossas motivações – caprichosas ou altruístas – acabamos por ficar derrotados perante a nossa miserável capacidade de mudar os outros para o que queremos.

Quantos cabelos brancos ganhos para que os outros fossem diferentes! Pais, filhos, namorados, namoradas, patrões e empregados, tudo a querer mudar os outros.
Os filhos nunca têm exactamente os pais que querem. Os empregados nunca têm os patrões que querem. As namoradas não têm os namorados que querem, e os maridos  as mulheres que querem. Todos querem alguém ligeiramente diferente. Mais simpático, responsável, atento, paciente, interessado, interessante…
 
Contudo esta abordagem levanta alguns problemas:
1. Começa pelo que o outro tem que mudar.
Temos listas infindáveis de exigências – desde a roupa que usam até ao interesse em literatura russa – que os outros deviam ter, e todas começam pelo que o outro devia mudar. E não pelo que eu posso mudar.
 
2. Saber o que o outro realmente precisa.
Já somos estupendamente desastrados a perceber o que realmente precisamos, quanto mais o que os outros precisam. Que prepotência achar que sabemos o que o outro precisa! Apesar de toda a nossa boa vontade, muitas vezes o que nós queremos não podia estar mais longe daquilo que o outro realmente precisa.
 
inesperado.org - 10 setembro 2013
3. Ser tudo para todos é nada para ninguém.
Se alguém quisesse ser o que toda a gente quer, não conseguia ser nada para ninguém. Como cada pessoa tem uma ideia própria sobre o que cada um devia ser, se alguém tentasse ser essa pessoa, rebentava (em muitos bocadinhos diferentes).
 
4. Mudar para agradar aos outros sai para o torto.
Por vezes agradamos aos outros para que gostem de nós. Mas uma pessoa que muda apenas para agradar, não muda no longo prazo. E torna-se cansativa passados 15 minutos.
 
5. Nunca ninguém é exactamente como queremos.
Quer a diva mais perfeita ou o namorado mais principesco têm aquela mania irritante. A imagem perfeita que criámos só existe na nossa cabeça. Na realidade, nem por isso.
 
Pouparíamos muita energia e tinta para os cabelos brancos, se aceitássemos o que os outros são.
 
 
 
Mas será que por isso devemos deixar de tentar de mudar os outros para melhor? 
Claro que não!
Mas isto de querer que o outro seja melhor não vai lá mudando alguém, mas gostando de alguém. O que muda os outros não são as nossas estratégias, os nossos argumentos ou as nossas palavras. É o nosso amor. Por isso não se trata de mudar, trata-se de amar. Se queremos demasiado que o outro seja diferente é porque não estamos a amar o suficiente.
 

Talvez o melhor que hoje podemos ouvir é… nunca vou ser o que tu queres.

Comments

Respostas de 18 a “Nunca vou ser o que tu queres.”
  1. Anónimo

    Podemos passar a vida toda na busca da perfeição. Arriscamo-nos a atingir a deceção.
    Quando observamos atentamente o que temos e tentamos descobrir todas as suas facetas , talvez cheguemos à conclusão que é daquilo que precisamos naquele momento. A perfeição está na capacidade de extrair o melhor de qualquer situação e crescer com isso.

  2. Tania

    Se nos esforçamos para melhorar e o outro não melhora, não é questão de mudar e de poder caminhar juntos.
    Ninguém é melhor que ninguém…

  3. Ana Cristina Silva

    Isto está tão certo! E sendo assim com os outros, como é connosco? Se eu não me amar, posso mudar e ser melhor? Desafios constantes da vida adulta… Adorei o texto, veio na altura certa!

  4. Maria

    Como tudo não se pode generalizar. Às vezes o outro não muda mas a sua “toxicidade” é insuportável… e aí temos de ser nós a mudar… de poiso e para bem longe!

  5. leninha

    Gostei muito João

  6. Gostei de mergulhar nesta reflexão.
    Pois… como sempre, dá que pensar. E que bom é podermos pensar e repensar sobre o muito que fazemos.
    Obrigada pela partilha

  7. carlalexandra

    Reblogged this on in my own defense.

  8. Na verdade ninguém muda ninguém, o que interessa mesmo é amar. A pessoa que se sente amada…pode realmente mudar mas a decisão de o fazer tem que vir do seu coração.

  9. Anónimo

    Nossa. Que liçao de vida vc me deu. Mas, na minha maneira de ver procuramos ajudar alguém tentando que el mude para melhor.

  10. Francisca Pereira de Almeida

    Muito bom João!!! Obrigado por este inesperado…foi mesmo na “mouche”. Muita verdade neste texto!!!

  11. José Duarte

    Como é que é possível que toda a gente concorda. Afinal ele ou ela ganhou. Seremos todos como ele quer, ou seja cada um será como é. Mas sempre foi assim mesmo que quisessemos mudar o outro o outro será sempre ele. Até porque seria impossível sentirmos todos da mesma forma, cada um sente a mesma coisa de forma diferente, porque ser igual é ser diferente.

  12. Rita Sacramento Monteiro

    João gostei! :) o desafio está mesmo em amarmos o outro aqui e agora. E às vezes dá cá um trabalhão! Até connosco próprios somos tramados!… mas há esperança e o teu texto lembra isso mesmo :)

  13. Anónimo

    Muito BOM. Simples e directo. Obrigada.
    Bjnhs

  14. Sara Oliveira Bastos

    Eu gosto da surpresa de acordar e trocar as notícias, que normalmente acompanham o meu pequeno-almoço, pelo artigo semanal do inesperado… É sempre tão inesperado e tão certeiro (às vezes dá dores de tão certeiro que é!).

    Obrigada por me deixares inesperadamente a “pensar”, logo desde manhãzinha, nem sempre é fácil… mas dá quase sempre para (procurar) ser mais. Obrigada.

    1. Obrigado Sara! Continua a aparecer – com ou sem pequeno almoço ;)

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